No Brasil, quem legisla sobre impostos muitas vezes é quem menos sente seu peso. Essa violação fica evidente ao observar os dados da Câmara dos Deputados: enquanto o trabalhador comum tem boa parte da sua renda comprometida com o Imposto de Renda, os parlamentares federais estruturam suas despesas de forma para maximizar os ganhos e minimizar a tributação .
Agora em 2025 , o salário-base (subsídio) de um deputado federal é de R$ 46.366,19 , conforme o Decreto Legislativo nº 172/2022 . Mas esse valor representa apenas parte da realidade. Somados os penduricalhos e benefícios, o total do pagamento mensal aos parlamentares pode facilmente ultrapassar R$ 93 mil e mais da metade disso não sofre incidência de Imposto de Renda .
Os benefícios e penduricalhos
De acordo com o Portal da Transparência da Câmara, os deputados federais recebem:
A maioria desses valores é definida como verba indenizatória , e por isso, não entra na base de cálculo do Imposto de Renda .
A crítica de quem entende o sistema por dentro
Para o tributarista André Charone , mestre em negócios internacionais e autor do livro “A Verdade sobre o Dinheiro” , essa blindagem fiscal é uma das mais perversas formas de desigualdade institucionalizada.
“Os parlamentares não estão fazendo nada ilegal. Mas o problema está justamente aí: o sistema é legalmente desenhado para proteger-los da tributação . A estrutura de transferência dos deputados e senadores é pensada para driblar o Leão dentro da lei “, aponta Charone.
Segundo ele, o sistema permite que o parlamentar receba quase o dobro do seu salário oficial, mas pague o imposto apenas sobre uma parte. “Enquanto o trabalhador assalariado não tem para onde correr tudo é tributado na fonte, os parlamentares vivem de um pacote de benefícios que foge da lógica da progressividade tributária ”, completa.
Comparativo: quem paga mais imposto?
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Charone destaca ainda:
“Esses números mostram que, no mundo dos políticos, quem ganha mais paga menos proporcionalmente . Isso contraria os princípios mais básicos da justiça fiscal. É como se o sistema dissesse que o esforço contributivo vale só para quem não tem poder político.”
Reforma tributária ignorou o topo da pirâmide
A Reforma Tributária avançou em temas como unificação de tributos sobre consumo e tributação de fundos exclusivos, mas, até o momento, não mexeu no regime de pagamentos e benefícios do Legislativo .
Para André Charone, isso escancara uma falha ética e estrutural:
“A elite política brasileira legislou uma reforma para os outros — e manteve suas próprias privilégios intactos. Nenhuma reforma será completa enquanto os que fizerem as leis continuarem protegidos delas.”
Quando o privilégio fiscal é regra, a justiça tributária vira exceção
A situação vivida pelos deputados federais evidencia uma verdade incômoda: o sistema tributário brasileiro não trata todos os contribuintes com a mesma régua . Ao estruturar suas remunerações por meio de auxílios e verbas indenizatórias legalmente isentas de Imposto de Renda, os parlamentares podem obter ganhos monetários superiores a R$ 90 mil , mas tributam efetivamente menos de metade desse valor.
Enquanto isso, o trabalhador comum, o autônomo e o pequeno empresário , cujas rendas são rigidamente monitoradas pela Receita Federal, não têm qualquer espaço de manobra . Toda a sua renda é tributada na fonte, sem direito a reembolsos, auxílios ou gabinetes com orçamento próprio.
Para o tributarista André Charone, essa é a materialização do que ele chama de “paradoxo fiscal brasileiro”:
“Quem tem mais renda, mais influência e mais acesso ao poder paga proporcionalmente menos. E quem está na base da pirâmide, com renda fixa, pouca margem de dedução e nenhum benefício institucional, sustenta o sistema.”
O efeito disso é uma perda de confiança no sistema tributário , que passa a ser visto não como um instrumento de equilíbrio social, mas como um mecanismo de perpetuação de desigualdades . A consequência vai além da injustiça fiscal: comprometer a substituição das instituições e o próprio pacto federativo.
Embora as reformas não toquem nas privilégios de quem faz as leis, a tão falada “justiça tributária” será apenas um conceito bonito nos discursos de campanha e um pesadelo para quem paga imposto na prática.
Sobre o autor:
André Charone é contador, professor universitário, Mestre em Negócios Internacionais pela Must University (Flórida-EUA), possui MBA em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria pela FGV (São Paulo – Brasil) e certificação internacional pela Universidade de Harvard (Massachusetts-EUA) e Disney Institute (Flórida-EUA).
É sócio do escritório Belconta – Belém Contabilidade e do Portal Neo Ensino, autor de livros e bolsas de artigos na área contábil, empresarial e educacional.
André lançou recentemente o livro ‘A Verdade Sobre o Dinheiro: Lições de Finanças para o Seu Dia a Dia’, um guia prático e acessível para quem deseja alcançar a estabilidade financeira sem fórmulas mágicas ou promessas de enriquecimento fácil.
O livro está disponível em versão física pela Amazon e versão digital pelo Google Play.
Versão Física (Amazon): https://www.amazon.com.br/dp/6501162408/ref=sr_1_2?m=A2S15SF5QO6JFU
Versão Digital (Google Play): https://play.google.com/store/books/details?id=2y4mEQAAQBAJ
Jornalista, radialista e advogado, formado na UFPB, Hermes de Luna tem passagens nos principais veículos de comunicação da Paraíba. É MBA em Marketing Estratégico e em mídias digitais. Apresentador e editor de TV e rádio, também atuou na editoria de portais e sites do estado. Ganhador de vários prêmios de jornalismo, na Paraíba e no Brasil.